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Décima Quarta Parte

Décima Quarta Parte

                       Décima Quarta Parte

                        A Divisão do Brasil

Foi somente a partir do cruzamento de ideias entre todas as lideranças, sentadas em volta de uma enorme mesa pentagonal improvisada (representando as cinco regiões do Brasil que lutavam contra o poder central), que o conflito enfim ganhou forma concreta. De fato, não tinha como voltar atrás, assim como não era possível que após tanto derramamento de sangue, as coisas simplesmente finalizassem com acordos unilaterais que atenderiam simplesmente aos interesses da União. Não era possível que o sacrifício heroico de tantos homens e mulheres de repente fosse tratado como algo fútil, esquecido através da consolidação de um acordo de paz. Todo o sofrimento infligido só poderia ser aplacado de uma maneira: “com a consolidação do objetivo comum, que visa o fim da unidade nacional e a extinção do corrupto sistema político brasileiro”. Era não apenas preciso, mas necessário que tudo fosse refeito, inclusive a Constituição, o Código Penal, o Código Civil, enfim todas as leis que antes de proteger os direitos do povo, atendiam primeiramente os interesses das elites e criavam brechas para que pessoas cheias de dinheiro pudessem escapulir aos rigores da frágil justiça, assim como a água escorre por entre os dedos das mãos. E com isso em mente, a URNON (sigla para União Revolucionária da Nova Ordem Nacional, como passou a ser conhecido o movimento unificado) se propôs a prosseguir sem tréguas rumo a seu objetivo, o qual visava a separação do Brasil entre as cinco forças revolucionárias que compunham a URNON. As regiões Norte e Centro-Oeste, desde o início, não haviam aderido completamente ao movimento – pelo menos não com o mesmo vigor que o resto do país –, de modo que seu frágil levante logo foi contido pelas forças de segurança locais e tudo voltou ao normal, com a ordem restabelecida sem muitos problemas e sem qualquer derramamento de sangue. Se limitaram portanto a assumir o papel de meros espectadores do horror que se desenrolava no restante do país, assolado pela guerra civil. De qualquer modo, aquelas regiões não constituíam grandes centros populacionais, assim como eram desprovidas de grandes centros urbanos. Não pareciam muito interessadas na revolução, o que lhes colocava ao lado do Governo central. Pelo acordo, os estados da região Sudeste se separariam em três partes. As regiões Centro-Oeste e Norte permaneceriam unidas ao Brasil, cuja capital continuaria sendo Brasília. Espírito Santo e Rio de Janeiro se tornariam um só país. Minas Gerais se tornaria independente como uma nação soberana, assim como São Paulo também. As regiões Sul e Nordeste, por sua própria natureza e culturas muito distintas e diferentes das demais, por si só já constituiam duas nações. Agora era só uma questão de oficializar e tudo estaria consumado. Após um novo encontro para ratificar os acordos anteriores, foi firmada a “Aliança de Petrópolis”, que reforçava “O Acordo do Anhangabaú” e decidia os destinos do pós-guerra, que não demonstrava sinais de exaustão. Com a resistência do Governo Federal em não ceder, o conflito se intensificou, ao mesmo tempo em que cada vez mais militares debandavam para o lado dos revolucionários. Este era um sinal mais que evidente da divisão que havia nas Forças Armadas, que obviamente não estavam nem um pouco satisfeitas com o Governo atual e seu empreendimento bélico numa guerra civil. Boatos informavam sobre a possibilidade dos militares estarem preparando um Golpe de Estado para depor o Presidente, que insistia em dizer que não renunciaria, pois havia sido “eleito pelo povo, para o povo, e somente o povo, em sua absoluta e incontestável soberania, tem o direito legítimo, pelos meios legais sustentados pela Constituição Federal, de retirar do poder aquele que escolheram para ser seu líder”. “Palavras de um patife mentiroso e corrupto que para se manter no poder não exitará em fuzilar a própria mãezinha”, ironizou um oficial que debandara para o lado da URNON. Enquanto o tal golpe não acontecia, as Forças Armadas continuavam a infligir pesadas baixas às fileiras insurgentes, com bombardeios e ataques aéreos seguidos. O objetivo era deter o avanço revolucionário rumo a Brasília. Agora que haviam perdido São Paulo, era preciso não apenas deter o avanço, mas rechaçar as forças separatistas que se aproximavam cada vez mais do centro do poder. Era um fato que com a adesão de São Paulo e seu poder de fogo, a situação havia ficado muito mais confortável para as forças da URNON. Bases militares, um enorme contingente de soldados profissionais dispostos a lutar em nome da causa, ao lado dos valentes insurgentes, tudo estava muito favorável para um avanço em relação ao desfecho da guerra, qua já havia ceifado centenas de milhares de vidas. E tudo que ninguém queria era isso: o prolongamento das matanças. Por outro lado, a máquina de propaganda rebelde também fazia sua parte, alimentando os ideais da URNON. “Por um futuro melhor, mais justo e digno! Por um futuro onde a justiça funcione e a educação seja respeitada! Por um futuro sem corrupção, sem corrompedores e sem corrompidos! E se sonhar por um país assim é pura utopia ou não, nosso objetivo é fazer desse sonho, dessa utopia a nossa realidade!” Se antes as forças governamentais lutavam para tentar manter a pouca ordem que teimava em subsistir diante do caos, agora todas as forças se concentravam para deter o avanço dos combatentes rumo ao poder central em Brasília, Distrito Federal. A chamada “integridade nacional” estava abalada, seriamente danificada, por um fio. Sem o poder e a força dos paulistas, que haviam aderido à URNON na luta contra o Governo Federal, as esperanças desses eram tão tênues quanto as próprias chances de reverter a situação.