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A Hora da Verdade
Augusto Montanaro saiu irritado do escritório do pai, o empresário do ramo alimentício Fabrizzio Montanaro, um filho de italianos que não gostava de coisas erradas. Indignado com as críticas do pai, que o chamou de playboy irresponsável, Augusto acelerou o carro em direção à Avenida Celso Garcia, de onde seguiria rumo ao Largo da Concórdia e por fim o centro da cidade, até o Bairro da Liberdade.
Com a Avenida Rangel Pestana à sua frente, ficou na dúvida. Seguir para a direita, rumo ao centro da cidade, ou para a esquerda? Furioso, bateu três vezes a testa no volante do carro. Deu uns socos fortes na porta e alguma buzinadas para desestressar, e mal o semáforo abriu, ele acelerou pro outro lado da pista e disparou na direção contrária, rumo à Avenida Celso Garcia, ansioso de chegar ao bairro da Penha. Lá encontraria consolo e forças nos braços de Suzanna, sua segunda namorada que obviamente desconhecia a existência da primeira namorada, Lawrie. Àquelas alturas, Suzanna já devia estar em casa.
Suzanna também era uma moça independente. Filha de um fazendeiro da região de Barretos, não gostava de ficar dependendo do dinheiro da família. Trabalhava numa empresa de consultoria, jornada de meio período, e fazia faculdade de psicologia. Embora não fosse uma pessoa ambiciosa, queria vencer por seus esforços e méritos.
No fundo Augusto sabia que o pai tinha razão. Ele já estava “enrolando” Lawrie há pelo menos seis anos, desde os tempos da faculdade. Sem contar que nesse meio tempo já saíra com pelo menos uma centena de outras meninas. E aquilo realmente não parecia muito certo. Lawrie era uma boa garota, independente, de boa índole e de boa família. O tipo de garota feita para o casamento. Certamente merecia alguém à sua altura e competência. Augusto, definitivamente, estava longe de ser esse alguém.
Pensou no jeito dócil de Lawrie e lamentou ser tão canalha. Mas ainda eram tão jovens para se envolver mais seriamente. Bastava pensar em casamento ou num envolvimento mais profundo, para começar a sentir dúvidas sobre seus sentimentos para com a linda jovem de ascendência nipônica.
De novo deu um soco no volante. Droga, se não amava a garota, então por que era tão difícil dar um basta àquela relação cheia de conflitos? Já não se viam há pelo menos três semanas. Mas não haviam terminado oficialmente. Claro que ela não se livraria de seu cachorro idiota, o que se tornava um bom pretexto pra Augusto dar uma “chega” no namoro.
No ínterim, Augusto sabia que quando a procurasse tudo ficaria bem. Lawrie era de espírito pacífico e bondoso, sempre dando um jeito de contornar as situações mais difíceis. Era de uma paciência invejável, digna de suas raízes orientais. Sempre contornava as mancadas recorrentes de Augusto, e certamente desconfiava que ele saía com outras garotas. Mas não era o tipo de menina que apelava pra baixarias. Era muito fina pra isso. No entanto, tinha atitude demais pra aceitar traição. Se soubesse das traições de Augusto, ela terminaria o namoro sem pestanejar.
Baseando-se nisso, bem em seu íntimo, algo dizia que desta vez quando ele a procurasse, as coisas seriam diferentes. Lawrie era madura, ao contrário dele, “um eterno moleque”, como dissera seu pai aos berros poucos minutos antes.
Augusto sabia que precisava conversar com a garota. Mas tinha que esfriar as idéias antes de procurá-la na Tech Nippo, que estava indo muito bem, graças à vocação e esforços de sua jovem dona.
Quisera ele ter ao menos um por cento da força e garra de Lawrie. Mas, coitado, não passava de um boa vida, um irresponsável acostumado a gastar dinheiro nas noites paulistanas, e que em certos momentos até já sentira as facilidades de ter um talento nato para gigolô.
Respirou fundo e decidiu que era hora de conversar sério com Lawrie e acabar com tudo. Era melhor assim, dessa forma ela poderia enfim dar um rumo à sua vida e encontrar alguém digno dela. Não era justo continuar enrolando alguém tão especial.
Ele nem entendia por que ela ainda não havia dado-lhe um chutaço na bunda. Seria por causa da antiga relação amigável que existia entre seus pais? É. Devia ser por isso. Lawrie era uma moça excepcional e muito sensível. Na certa não queria deixar os pais de Augusto tristes, já que eles apostavam muito na relação dela com seu herdeiro.
Mas hoje isso teria um final definitivo. Não continuaria sendo o vilão de uma relação onde uma pessoa era um símbolo de perfeição e a outra uma ovelha negra irremediável. Na melhor das definições, um típico canalha.
– Pior que é exatamente isso que eu sou, balbuciou ele.