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Nona Parte

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                                     Nona Parte

 

No ínterim, no acampamento sob o imbuzeiro, eis que o menino despertou de seu pesado sono, alheio aos últimos acontecimentos. Sentou-se na rede e chamou pelo pai.

– Papai? Papai? Papai! Papai! Papai...

Mas não houve resposta nenhuma. Procurou ao redor, mas nada. Seguiu até a estrada e imaginou que seu pai, por alguma razão qualquer, decidira ir até a fazenda de Nhô Simão. A criança sempre viajava por aquela estrada com o pai e portanto sabia que a fazenda não ficava muito longe dali. Instintivamente, começou a caminhar na direção da fazenda, sob o claro intenso do luar que deixava a noite quase dia. Segurou o terço e começou a rezar “Ave Maria”, como aprendera com os pais. E seguiu em frente. Após caminhar alguns minutos, notou ao longe uma pessoa que vinha provavelmente da fazenda de Nhô Simão. Seria seu pai? Mas logo percebeu que era uma pessoa muito alta e magra que andava de um jeito muito desengonçado. E por fim viu que era uma mulher. A mulher mais assustadora que já vira. Quando ela finalmente parou à sua frente, a respiração arquejante e o vestido esfarrapado balançando ao vento, o garoto teve a clara percepção de que algo estava muito errado. Seu corpo começou a tremer dos pés à cabeça. Mesmo assim, após alguns segundos de relutância, lentamente e sem parar de rezar o terço, direcionou o olhar em direção à cara da criatura. Era uma cara magérrima de onde dois pares de olhos enormes e esbugalhados o observavam fixamente. Sobre a cabeça seca e alongada da estranha mulher, cabelos crespos abundantes criavam uma sombra que o impedia de ser ofuscado pelo luar intenso. Voltou a abaixar a cabeça lentamente, ao passo que rezava com mais fervor. Pensou que se não olhasse a aparência daquela mulher apavorante, evitaria que o medo o dominasse com tanta força. Mantendo a cabeça reverenciosamente baixa, olhava com espanto aqueles pés enormes e esqueléticos, donos de unhas pontiagudas como as garras de uma fera selvagem.

Por fim, a criatura fez ouvir sua voz.

– O que é isso, menino?

Apontou o longo dedo fino para o rosário em suas mãos.

– Um terço, respondeu ele.

Com a longa unha do dedo apontador ela ergueu o terço até a altura dos olhos. Balançou a cabeça em negação e berrou:

– Coisa inútil, menino besta!

Berrou ela lançando o objeto longe. O menino continuou quieto, de cabeça baixa e a pronunciar o terço.

– Tu tens pai, menino? Gritou a criatura.

O menino não respondeu, apenas continuou a rezar o terço em voz baixinha, morrendo de medo.

– Menino, quem é teu pai? Quem é teu pai, menino?

– É um homem...

Respondeu a criança no limite de seu terror mais impensado.

– Esse homem tem nome, menino?

– É um homem...

– Menino idiota, qual o nome de teu pai?

– É um homem...

A criatura, dominada por sua fúria insaciável, agarrou o garotinho e o ergueu como se fosse um bonequinho. Cheirou-o dos pés à cabeça, em seguida o aproximou mais a fim de olhá-lo bem de perto, com se quisesse vislumbrar nele algum traço conhecido. E ao olhar dentro de seus olhos, praguejou alto.

– Ô, diabo, te pego sim! E te peguei!

Chacoalhou a criança com uma só mão acima de sua cabeça, indiferente aos gritos de terror do menino. Enquanto praguejava a sacudir a criança no ar, o monstro não se decidia sobre o que fazer. Então num ímpeto de monstruosidade, lançou-a com toda sua força contra um toco pontiagudo que tinha ali bem à beirada da estrada. O toco traspassou a criança, destroçando seus órgãos internos e deformando seu corpo frágil. Mas ela não parava de berrar de ódio, amaldiçoando tudo ao seu redor. Não parecia satisfeita de matar a pobre criança. Por fim seguiu rumo ao acampamento, onde destruiu tudo. E quando não tinha mais nada para rasgar, avançou contra os animais amarrados e os retalhou com suas unhas gigantescas e afiadas. Depois desapareceu na noite do sertão enluarado.